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Dor crônica: cientistas descobrem sinais cerebrais que podem ajudar em tratamentos; entenda

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Pesquisadores registraram impulsos cerebrais em pacientes que sentiam dores ininterruptas. Achados oferecem pistas para futuros mecanismos de previsão e até anulação da dor

Pesquisadores registraram pela primeira vez os padrões de impulsos nervosos do cérebro de uma pessoa que está sob dor crônica, abrindo caminho para que no futuro dispositivos implantados consigam prever sinais de dor ou até mesmo anular seu mecanismo.

Usando um dispositivo semelhante a um marca-passo colocado por procedimento cirúrgico dentro do cérebro, os cientistas registraram os impulsos cerebrais de quatro pacientes que sentiam dores ininterruptas nos nervos por mais de um ano. Os dispositivos fizeram registros várias vezes ao dia por até seis meses, oferecendo pistas sobre onde a dor crônica se localiza no cérebro.

O estudo, publicado na revista Nature Neuroscience, relatou que a dor estava associada a flutuações elétricas no córtex orbitofrontal, uma área envolvida na regulação emocional, na autoavaliação e na tomada de decisão. A pesquisa sugere que tais padrões de atividade cerebral podem servir como biomarcadores para orientar o diagnóstico e o tratamento de milhões de pessoas com dores crônicas ligadas ao sistema nervoso.

“O estudo realmente avança toda uma geração de pesquisa que mostrou que o funcionamento do cérebro é importante para processar e perceber a dor”, disse o Dr. Ajay Wasan, especialista em medicina da dor da Escola de Medicina da Universidade de Pittsburgh, que não participou do estudo.

Cerca de 1 em cada 5 adultos americanos sente dor crônica, que é definida como uma dor persistente ou recorrente que dura mais de três meses. Para medir a dor, os médicos geralmente se baseiam nas autoavaliações dos pacientes, a partir de uma escala numérica ou visual com emojis. Mas as medidas de dor expressas pelos pacientes são subjetivas e podem variar ao longo do dia. E alguns pacientes, como crianças ou pessoas com deficiência, às vezes têm dificuldade para comunicar sua dor com precisão.

“Há um grande movimento no campo da dor para desenvolver marcadores de dor mais objetivos, que possam ser usados juntamente com as autoavaliações”, disse Kenneth Weber, neurocientista da Universidade de Stanford, que não participou do estudo. Além de avançar nossa compreensão sobre quais mecanismos neurais estão por trás da dor, Weber acrescentou, esses marcadores podem ajudar a validar a dor sentida por alguns pacientes que não é totalmente reconhecida – ou é até mesmo totalmente ignorada – por seus médicos.

Estudos anteriores geralmente escaneavam os cérebros de pacientes com dor crônica para observar mudanças no fluxo sanguíneo em várias regiões, uma medida indireta da atividade cerebral. Mas esse tipo de pesquisa se restringe a ambientes de laboratório e requer que os pacientes visitem um hospital ou laboratório várias vezes.

No novo estudo, o Dr. Prasad Shirvalkar, neurologista da Universidade da Califórnia, em São Francisco, e seus colegas usaram eletrodos para medir o padrão de disparo coletivo de milhares de neurônios nas proximidades dos eletrodos.

Os pesquisadores implantaram cirurgicamente os dispositivos em quatro pessoas que viviam com dor havia mais de um ano e não encontraram alívio nos medicamentos. Para três dos pacientes, a dor começou após um acidente vascular cerebral. O quarto teve a chamada dor do membro fantasma depois de perder uma perna.

Pelo menos três vezes ao dia, os pacientes avaliavam a dor que estavam sentindo e então pressionavam um botão que estimulava seus implantes a registrar sinais cerebrais por 30 segundos. Com o acompanhamento diário de pacientes em casa e no trabalho, “esta é a primeira vez que avaliamos a dor crônica no mundo real”, disse Shirvalkar.

Os pesquisadores colocaram eletrodos em duas áreas do cérebro: o córtex orbitofrontal, que não vinha sendo muito estudado nas pesquisas sobre dor, e o córtex cingulado anterior, região envolvida no processamento de sinais emocionais. Muitos estudos sugeriram que o córtex cingulado anterior é importante para perceber a dor aguda e crônica.

Os cientistas carregaram os dados das pontuações de dor dos pacientes e os sinais elétricos correspondentes em modelos de aprendizado de máquina, que então puderam prever estados de dor crônica alta e baixa com base apenas em sinais cerebrais.

Os pesquisadores descobriram que certas flutuações de frequência do córtex orbitofrontal eram os melhores preditores de dor crônica. Embora essa assinatura cerebral fosse comum entre os pacientes, disse Shirvalkar, cada paciente também apresentava uma atividade cerebral única. “Cada paciente tinha uma impressão digital diferente para sua dor”, disse ele.

Diante dessas variações e do baixo número de participantes do estudo, Tor Wager, neurocientista do Dartmouth College, que não participou do estudo, sugeriu cautela antes de classificar as assinaturas do córtex orbitofrontal como biomarcadores.

“Definitivamente, precisamos corroborar isso com outros estudos, usando outras metodologias que possam fornecer uma cobertura sistemática de todo o cérebro”, disse ele.

Os autores do estudo também observaram que outras regiões do cérebro podem estar envolvidas. “Estamos só começando”, disse o Dr. Edward Chang, neurocirurgião da Universidade da Califórnia, em São Francisco. “Este é só o primeiro capítulo”.

Os implantes também servem a outro propósito: estimulação cerebral profunda. Como parte de um ensaio clínico maior para tratar a dor crônica, Shirvalkar e seus colegas estão usando correntes elétricas leves para estimular as regiões cerebrais próximas aos eletrodos. Além dos quatro pacientes do estudo que já estão recebendo essa terapia experimental, os pesquisadores querem recrutar mais duas pessoas e, com o tempo, expandir o estudo para outras vinte ou trinta. Os pesquisadores esperam aliviar a dor persistente enviando pulsos através dos eletrodos para corrigir qualquer anormalidade na atividade cerebral.

Este artigo foi originalmente publicado no The New York Times. /TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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