“Se vocês olharem as pesquisas de confiança no sistema de urnas eletrônicas, vão ver números preocupantes”, destaca Fraga durante o evento “E Agora, Brasil?”
Os ex-presidentes do Banco Central (BC) Arminio Fraga e Pedro Malan mostraram preocupação com o impacto que o momento político conturbado pode ter sobre a economia brasileira, inclusive atrapalhando no controle da inflação, que está em 12% no acumulado de 12 meses. Os dois economistas participaram nesta terça-feira do evento “E Agora, Brasil?”, promovido pelos jornais O Globo e Valor.
“As bases da nossa democracia estão sendo questionadas. Se vocês olharem as pesquisas de confiança no sistema de urnas eletrônicas, vão ver números preocupantes. Existe uma campanha nessa linha de desmoralizar esse sistema, mesmo que ele tenha se mostrado blindado. Isso representa um ataque frontal ao TSE e ao Supremo [Tribunal Federal], e tem implicações econômicas da maior importância”, disse Fraga, ex-presidente do Banco Central e sócio-fundador da Gávea Investimentos.
Malan, ex-ministro da Fazenda e também ex-presidente do BC, comentou, por sua vez, que a desorganização institucional prejudica a economia.
Ele observa que é importante a existência de uma relação funcional dentro do Executivo e na capacidade de articulação com o Congresso.
Defendendo um ambiente político mais estável que contribua para a economia, também apontou preocupação com o que classificou como “excessiva judicialização de questões que deveriam ser resolvidas no âmbito da política”.
Malan cita ainda a necessidade de os candidatos à Presidência incorporarem nos programas econômicos sendo preparados por suas equipes a questão de equilíbrio orçamentário. “Gostaria que houvesse uma discussão sobre a qualidade do Orçamento na [campanha eleitoral]. Precisamos melhorar a qualidade do debate que nós temos, ainda mais no período antes da eleição”, disse.
Ainda durante sua participação no evento, Fraga disse que o Brasil preciso ir muito além do ajuste fiscal para retomar o bom caminho na economia e deixou críticas sutis ao atual governo.
Ele se disse preocupado com a guinada de gastos públicos e até onde o país pode aguentar, depois de ter ponderado por várias vezes que o controle da inflação passa por uma combinação inseparável de política monetária e fiscal andando no mesmo caminho, o que, segundo ele, não está acontecendo.
“Esse tipo de guinada de prioridades do setor público só pode acontecer durante uma crise, mas eu não sei se o Brasil aguenta mais uma. Tenho perdido muito o sono com isso”, afirmou o ex-presidente do BC. “Se quem for eleito sinalizar um caminho, penso que as coisas ainda podem entrar nos trilhos. Tem que ser um caminho crível e tem que ser coisa grande”, acrescentou.
O economista argumenta, contudo, que, para encaixar o país nos trilhos, é preciso mais do que ajuste fiscal. “Os ajustes precisam ir muito além do ajuste fiscal para colocar a trajetória da dívida em um ponto sustentável. A dívida ficar a 80%, 90% do PIB não é o suficiente. Vamos ter que ir muito além pra repriorizar o gasto e irmos nessa direção.”
Em sua visão, até mesmo temas como meio ambiente precisam entrar nessa equação. “Eu não creio que as pessoas entendam que o que acontece na Amazônia nos afeta aqui embaixo. Mas é fato que, se a destruição da Amazônia continuar, todo esse grande sucesso que é a agricultura brasileira vai ficar extremamente prejudicado. Vai faltar água”, alertou.
“Como é que você introduz isso numa discussão com o eleitorado? Não sei qual é a resposta, mas isso precisa acontecer.”
O sócio da Gávea Investimentos deixou no ar uma crítica à condução atual da política econômica. “O que me dá alguma esperança é que tem mais gente jovem entrando na política. Do lado da economia, as coisas estão tão mal, tem tanta coisa que dá para melhorar, que acho que, com um governo arrumado, bem tripulado e que tenha clareza nos objetivos e capacidade de execução, o espaço para melhorar é muito grande. Isso pode soar sarcástico e talvez até seja, mas não deixa de ser uma oportunidade”, disse.
“Espero que as pessoas acordem, porque nós, ao contrário dos EUA, que podem fazer uma política hiperagressiva durante muito tempo, não podemos”, observou.
Para Malan, o ponto não é ficar defendendo a redução de gastos públicos, mas definir melhor onde gastar. “A agenda não é de redução de gastos. É uma agenda de discussão sobre prioridades”, disse
Fonte: Valor Econômico
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