Por Samuel Lima, Gustavo Queiroz e Levy Teles
Os candidatos à Presidência Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) chegam à reta final do segundo turno com uma disputa ainda mais acirrada para atrair o interesse do eleitor nas redes sociais e acima de R$ 42,3 milhões investidos em propaganda no Google. O atual presidente, que venceu com folga a rivalidade nas redes em 2018, encontrou nestas eleições um oponente disposto a duelar pelo campo digital, apoiado por influenciadores, aliados políticos, anúncios e usando estratégias comuns no bolsonarismo, como propagar pânico e desinformação. A vantagem direta, no entanto, segue com o candidato do PL.
Levantamento do Estadão sobre os perfis oficiais dos candidatos no Twitter, Facebook, Instagram e YouTube mostra que Bolsonaro tem maior alcance em praticamente todas as redes sociais. Ele ainda conta com uma base estabelecida e uma legião de blogueiros, aliados políticos e comentaristas dispostos a amplificar a mensagem da campanha. Em contrapartida, Lula e seu ecossistema de apoiadores se mostrou competitivo — conquistou seguidores na mesma proporção do candidato à reeleição e por vezes gerou mais engajamento nas postagens.
“Lula é um candidato analógico, com uma estrutura burocrática partidária que teve um esforço de adaptação digital”, afirma o professor do Departamento de Comunicação da PUC-Rio Marcelo Alves. “A diferença nesse campo foi reduzida. Ainda que a direita continue com uma margem, houve um nivelamento.”
Para o doutor em Comunicação e Cultura da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Fábio Malini, a lacuna entre Lula e Bolsonaro nas redes se explica pela ausência do petista no mundo digital por um período.
“O bolsonarismo criou uma cultura de fazer campanha a todo o tempo e mobiliza pessoas a um processo de reprodução contínua de conteúdos, além de ter uma estrutura política que se tornou mais forte. O campo da esquerda ganhou muita aderência do mundo do entretenimento. Fez com que o maior youtuber brasileiro (Felipe Neto) passasse a praticamente fazer campanha diária para Lula”, diz o pesquisador.
Linguagem
Isso se traduz na estética usada pelos perfis. Malini aponta que Lula tenta estabelecer um nível de estabilidade e confiança, com peças mais vinculadas à estética audiovisual e televisiva. Já Bolsonaro se apropria da rede sob o mesmo filtro com que se construiu como persona pública, argumenta o pesquisador – com uso de memes e deboche, por exemplo.
“Tem um limite dessas estéticas, uma comunicação muito formal, que cria um certo distanciamento. A campanha de Bolsonaro pode descambar para a ridicularização, falta de credibilidade. São limites e vantagens que cada uma dessas campanhas tenha contemplado”, aponta.
As redes do ex-presidente são alvo de disputa entre membros na campanha, que adota uma postura mais pragmática. No Instagram, por exemplo, reproduz as cores e estética dos materiais da campanha televisiva; no Twitter, repete falas ditas em lives. Bolsonaro, por outro lado, usa memes e imagens no Instagram, dando a impressão de um material mais caseiro.
Um exemplo da diferença de tratamento passa pelas “superlives” dos candidatos, destaca o pesquisador Guilherme Felitti, da Novelo Data. Enquanto o petista fez uma espécie de evento offline num teatro com palco, tapete vermelho e apresentações de artistas transmitido pelas câmeras no primeiro turno, Bolsonaro preferiu uma “mesa redonda” em que convidados se revezavam na conversa ou participavam por vídeo, em uma linguagem mais comum da internet.
Publicações
No pódio dos tuítes que geraram mais engajamento dos dois candidatos estão publicações em que os postulantes partem para o ataque. A ironia para trocar acusações se tornou uma estratégia comum nos perfis oficiais, que delegaram o “jogo sujo” para apoiadores. É justamente quando um candidato fala do outro que seus seguidores mais repercutem as publicações.
Lula alcançou 292 mil curtidas em uma publicação em que diz somente “será no ano que vem”. A legenda veio acompanhada de uma imagem em que Bolsonaro interage com um usuário sobre os sigilos impostos em seu governo sobre temas sensíveis à gestão. O presidente diz que em 100 anos as pessoas saberão o motivo dele impor tais sigilos. Já o petista indica que, se eleito, vai derrubar os decretos impostos pelo atual chefe do Executivo.
O maior engajamento obtido por Bolsonaro também tem o adversário como figura central. O perfil oficial do presidente publicou uma foto de Lula durante o debate da Band no segundo turno em que o ex-presidente faz o número 22 com a mão. O presidente ironiza, como se o gesto fosse na verdade uma alusão ao seu número de urna e aproveita para vincular o petista a demônios. “Após exorcismo, Lula pede voto para Jair Bolsonaro 22. Kkkkkkk”, escreveu na publicação, que teve 205 mil curtidas.
Tanto Lula quanto Bolsonaro têm “povo” entre as palavras mais usadas nas publicações no Twitter. Na rede, há outras coincidências. Os dois usam termos como “família” e “democracia” e citam o adversário na mesma proporção. A diferença fica por conta de palavras-chave também usadas nos debates e programas de TV. O ex-presidente fala muito em “esperança”, enquanto Bolsonaro aposta em “liberdade” e “valores” nas suas publicações.
Disputa
Bolsonaro é dono de canais mais abrangentes nas redes sociais. No Facebook, por exemplo, tem quase o triplo de seguidores do que Lula, e no Instagram, mais do que o dobro. Esse fato explica porque, das dez postagens mais relevantes no período nas duas contas, nove são suas em ambas as plataformas.
Lula, por outro lado, conseguiu ampliar a sua presença digital com uma maior frequência de posts diários desde 16 de agosto e conseguiu angariar seguidores em um ritmo semelhante ao de Bolsonaro. Ainda assim, frente a um público menor, teve significativamente menos interações (soma de curtidas, comentários e compartilhamentos) nas duas redes.
A única plataforma analisada em que Lula teve vantagem entre as páginas oficiais dos candidatos foi no YouTube, segundo levantamento da Novelo Data, feito a pedido do Estadão. Felitti destaca, porém, que o “ecossistema ideológico” de Bolsonaro é mais pulverizado em contas de influenciadores e apoiadores com públicos amplos, o que faz com que o candidato dependa menos da sua própria conta e a mensagem circule mais.
“Em 2018, o YouTube era praticamente um playground bolsonarista. A impressão é que Bolsonaro ganhou por WO (não teve adversário)”, afirma Felitti, com base no ranking de vídeos mais relevantes daquela campanha presidencial. “Este ano, foi algo mais equilibrado. A campanha do Lula correu atrás gastando dinheiro em publicidade.”
O formato de vídeos de duração reduzida alimentado pelo TikTok impulsionou as eleições, aponta Malini. “O microvídeo, do TikTok e do Instagram, se tornou a linguagem de maior alcance e tornaram esse formato muito persuasivo e pervasivo. A arena digital ficou muito mais intensa e tornou a informação muito volátil”, diz. Lula entrou no TikTok apenas em junho deste ano e tem 3,1 milhões de seguidores; Bolsonaro, entrou em outubro de 2021 e tem 4 milhões de seguidores.
Anúncios
A reta final de campanha também teve uma avalanche de verba publicitária de Bolsonaro no Google, superando o gasto do petista com a propaganda na internet. Segundo dados da empresa, o candidato do PL gastou R$ 23,8 milhões desde o começo da campanha, em 16 de agosto, até o dia 25 de outubro. A maior fatia se deu nesta semana. O petista investiu ao todo R$ 18,5 milhões em impulsionamento.
Em apenas cinco dias (entre 20 e 25) , Bolsonaro gastou 72,8% (R$ 17,3 milhões) do total investido desde o início da campanha. Os cinco Estados priorizados pelas duas campanhas são os mesmos, em ordem: São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia e Paraná.
O especialista em Google Ads (plataforma de anúncios da empresa) Gustavo Coelho relata que a maioria do gasto em anúncios de ambos os candidatos é destinada a críticas ao adversário ou conteúdos para se defender de ataques, e não para divulgar agenda ou propostas. No caso de Lula, rebatem afirmações de que fecharia igrejas, e no de Bolsonaro, de que seria pedófilo, por exemplo.
Fonte: Estadão
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