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O exercício do voto é maduro no Brasil?

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João Gabriel Batista**

Às vésperas do segundo turno de uma eleição extremamente polarizada e já considerada a mais importante desde o restabelecimento do voto direto no Brasil, torna-se pertinente questionar o quão maduro é o processo da escolha de um candidato.

Com 91,6% dos votos do primeiro turno concentrados em apenas dois candidatos, é sabido que a tão falada terceira via não prosperou. A divisão do País em dois polos se concretizou não só de forma matemática, mas também por uma defesa rara e, ao mesmo tempo, incisiva de um dos dois candidatos: dificilmente se encontra alguém indiferente a Lula ou Bolsonaro. Ou você ama um ou odeia o outro. Aqui também não existe uma “terceira” alternativa. Esse comportamento se reverbera diariamente no posicionamento dos brasileiros nas redes sociais, em rodas de amigos, familiares ou até mesmo nas conversas mais despretensiosas.

O fato de amar um candidato ou odiar o outro estimulou uma adoração por políticos como se fossem artistas ou representassem um time de futebol. O ad hominem (quando uma ideia é posta em dúvida por causa de seu emissor, e não por seu mérito) imperou a ponto de as pessoas se submeterem a malabarismos semânticos. E é muito simples comprovar isso: basta levar alguma declaração polêmica de Lula ou Bolsonaro a um de seus defensores, sem citar o autor da frase. As chances de haver discordância são altas. Mas bastará creditar o emissor de tal opinião para que a relativização comece. “Veja bem…”, “essa frase foi tirada de contexto” ou “ele é assim mesmo, não falou por mal” serão só algumas das ponderações que você escutará (e isso se tal pessoa não colocar a culpa no mensageiro, passando o ônus para algum veículo de mídia responsável por disseminar a mensagem).

A eleição deste ano relegou a segundo plano temas essenciais para o País. Nunca uma agenda de políticas públicas e econômicas, que deveria ser o fio condutor de qualquer mandato, foi tão ignorada. Vivenciamos um momento em que, por causa do extremismo, o objetivo passou a ser aniquilar o adversário.

A participação do cidadão na vida política de seu país se divide em duas etapas: o momento do voto e a lacuna de tempo existente até o pleito seguinte, ou seja, até que um novo voto seja dado.

No momento do voto, é possível fazer analogia à caixinha tão conhecida, mas tão ignorada por todos na internet: “Estou ciente e quero continuar”. Você escolhe um lado. Na urna, não há um campo de observações ou comentários. Não é possível pedir para tirar a cebola da pizza, ou um suco, em vez de um refrigerante, ou trocar a batata média por grande. Mas não só é possível, como é extremamente saudável votar em um candidato e ter ressalvas contra vários pontos de seu programa de governo, à sua personalidade ou à sua forma de condução.

Já no segundo momento – o mais longevo –, você não só pode, como deve criticar os atos de que discorda. E isso não deve ser um parâmetro para que os outros deslegitimem a sua escolha, como se no momento do voto você estivesse assinando um cheque em branco ao candidato escolhido. A discussão política precisa ser tratada com maturidade, e não como discussões por artistas ou times, pois estas tangem apenas ao espectro de entretenimento e não influenciam na vida do País.

A maturação do eleitor brasileiro acompanha a evolução da nossa democracia. Estamos na nona eleição para presidente desde a redemocratização. São apenas 33 anos. Pode parecer muito tempo, mas não é, afinal neste período houve três mudanças nas regras do jogo com a bola rolando: a emenda da reeleição, de 1997, feita para beneficiar diretamente Fernando Henrique Cardoso, mas que por tabela se estendeu a todos os chefes do Poder Executivo; e os dois impeachments – o de Fernando Collor (1992) e o de Dilma Rousseff (2016). Neste espaço de tempo de pouco mais de três décadas, apenas FHC e Lula foram eleitos e cumpriram seus mandatos até o fim (Jair Bolsonaro deve ser o terceiro).

Nosso sistema eleitoral é extremamente justo: cada cidadão tem direito a um voto, não havendo distinção de pesos por poder econômico, região de origem ou status social. O voto é o único exercício igualitário que nos foi concedido. Além do voto, a sociedade só se iguala no que tange à fisiologia (necessidade de respirar ou de se alimentar), que por sua vez não precisou ser concedida ou positivada por alguém, afinal é uma condição inerente à existência do ser humano.

Por fim, é imprescindível que, além deste exercício, também seja feito o da empatia a partir da ponderação não só do que é bom para você, mas para o coletivo, sobretudo para as pessoas que são mais impactadas pelas políticas públicas (ou pela falta delas). O não uso de serviços públicos como saúde, educação, transporte ou necessidade por moradia, bem como o fato de não pertencer a alguma minoria não deveriam, em hipótese alguma, justificar que se ignorem as entregas ou promessas de determinados candidatos nessas esferas.

Independentemente do resultado das urnas, precisamos evoluir os diálogos políticos no Brasil para um patamar mais maduro. É necessário resgatar a importância da existência de uma agenda – pois é ela, ou a ausência dela, que irá determinar como a vida dos cidadãos será impactada nos quatro anos seguintes.

** É CONSULTOR DE MARKETING

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